terça-feira, 11 de março de 2014

Abstinência

Passei uma vida fazendo exatamente o que esperavam de mim. Demorei pra perceber que nunca estariam satisfeitos e que eu nunca estaria feliz por isso. Demorei mais ainda pra perceber que na verdade, ninguém esperava nada de mim. Talvez as circunstâncias tenham me levado a acreditar que eu estava no caminho certo e que precisava provar um milhão de coisas, para quem quer que fosse, coisas que de algum modo eu já provei. Mas no fim das contas, todos somos tão egoístas que só olhamos para nossas próprias escolhas. O mundo não está nem aí se você fez tudo certo ou errado. E você também, tão preocupado em ser alguém, não está nem aí para o que acontece ao seu lado. Então, pra quê? Qual o sentido de tudo isso?
De repente você se vê numa estrada sem retorno. Existem momentos que não permitem arrependimentos e não podem ser desfeitos. Infelizmente não dá pra voltar lá no começo e fazer tudo diferente. Infelizmente não dá pra desfazer negócios, nem fugir das responsabilidades que assumimos. Não é como nos filmes, sabe?! Naquela parte que a garota tem uma inspiração incrível, vende tudo num piscar de olhas e vai embora pra Irlanda... Não é assim! Ou pelo menos não é rápido. É o tal processo, do qual falamos na postagem passada. Não tem como acelerar. Agora é o momento de ficar em silêncio e aguentar firme, por mais que a vontade de jogar tudo pro alto seja capaz de nos enlouquecer. A gente se sente prisioneiro dos próprios erros e não consegue correr. Mas é diferente de todas as outras crises, porque agora é muito mais real.
Um dia ou outro você também vai acordar e vai ficar com raiva de você mesmo por ter sido tão idiota, por tanto tempo. Uma hora ou outra, depois de parar de se culpar e de culpar o mundo, por ter perdido tempo fazendo o que achava que esperavam de você, irá se perdoar e compreender que nada mais importa. Então vai começar uma busca pela sua essência, pra tentar se conhecer e não vais mais querer ser influenciado por ninguém. Vai querer tanto se libertar que até as prestações parecerão um calvário.
Nesses momentos você fará promessas a si mesmo, mas com muito mais clareza do que antes, e não por birra, mas porque realmente precisa mudar. É certo que ainda existirão momentos e caminhos que parecerão muito mais fáceis, pra que você apenas permaneça onde está, exatamente do jeito que está e quando acontecer, você já vai estar tão cansado de tentar que vai querer muito desistir e voltará pra casa chorando, brigará com Deus, seus pulmões vão doer, sua garganta vai trancar e você vai se torturar muito, porque sabe que permanecer como está é mais fácil, mas quer muito, muito mudar e se sente sem forças pra continuar.
Você vai pensar em um milhão de coisas horríveis e em seguida procurará mais um resquício de força pra pensar outro milhão de coisas positivas. Então vai ter raiva da maldita positividade e dizer que ela não funciona. Vai ter raiva do seu ex namorado e achar que todo o seu inferno começou com ele. Vai ter raiva do seu chefe e achar que na verdade a culpa é dele. E finalmente vai ter ainda mais raiva de si mesmo, por ser tão covarde e tão pobre. E como não tem outro jeito, vai juntar seus pedaços e levantar no outro dia, ainda procurando em Deus, nos seus pais e no mais íntimo do seu coração os sonhos e os motivos pra isso.
É o processo. Parecemos viciados em abstinência, entre tremores, recaídas, falta de fé, raiva, dor, crises e força de vontade, fé, coragem. É exatamente assim. Agora estamos fechados numa clínica de reabilitação. Um espaço só nosso, pra gente se encontrar, se conhecer e se suportar. Essa é a primeira vez que fomos até lá por nossa própria vontade, mas não significa que não queremos fugir. Pelo contrário, tento fugir da minha missão todos os dias. Quero muito escapar dali e ser só feliz, parece que eu já estive feliz antes e parece que também já estive nessa clínica antes. Tem horas que sinto que estou indo bem, mas então meus medos me atacam e eu ainda não consigo me defender. Caio, fico no chão, até conseguir levantar e recomeçar de novo.
A lentidão dos processos me incomodam, mas consigo entender que é necessário que seja assim. Sinto que vai acabar logo e sinto que quando acabar eu terei aprendido mais do que esperava. Então poderei realmente ser livre...

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