quinta-feira, 4 de janeiro de 2024

Aniversário de dor

Recentemente, um vídeo de um menino falando com paixão um dos mais famosos ensinamentos do Rock Balboa para o Stallone, viralizou. Sabe, aquele em que ele fala que a vida vai bater forte e tal, resiliência:

    "Ninguém vai bater mais forte do que a vida. Não importa como você bate e sim o quanto aguenta apanhar e continuar lutando; o quanto pode suportar e seguir em frente. É assim que se ganha."

Já acreditei tanto nisso. Já preguei tanto isso. Depois de tanta surra, aqui na véspera do aniversário da última vez que fui nocauteada, penso que tem algumas brigas que arrasam com a gente. Ok, você levanta, mas nunca mais é igual. Começa a colecionar cicatrizes no caminho, vai ficando mais cansado, derrotado à cada vitória, chega uma hora que nem entende mais o sentido, o porque de tanta luta e só quer sarar (ou morrer) - (Isso pareceu dramático e forte demais, mas é mais no sentido de desistir, de cessar).

    Na igreja aos domingos a mulher no palco lembra que é preciso desatar nós, desprender das âncoras que nos puxam pra baixo. Na Bíblia tem várias passagens sobre abandonar o passado e fazer tudo novo. A amiga diz que eu preciso colocar no mar do esquecimento. Hoje numa conversa aleatória, alguém perguntou de uma cicatriz da infância e ao me ouvir falar que preferia ter apanhado dos meus à ser mal tratada e humilhada pela madrasta - ainda que do meu ponto de vista eu tenha dito isso sem nenhuma raiva - me falou sobre liberar perdão e que provavelmente essa tortura é minha e que a pessoa nem sabe. Faz sentido. Ainda que pra mim já estivesse de alguma forma tudo acertado. Perdoado e não se fala mais nisso. Tenho o costume de pensar nas razões das pessoas, a fim de sempre justificar as dores que me causaram, sempre tentando salvar aos outros, nem que eu apanhe. Mas tem que perdoar e só. Dizem.

   Nunca aprendi como. A cicatriz fica. A dor fica um tempão. Surra deixa marca. Apanhar da vida assim vai quebrando a gente, pedaço por pedaço, tem horas que nem que junte não cola mais. E aí, você fica mais amargurado e descrente. Desconfia até de Deus (perdão pela blasfêmia Senhor). Não é de propósito, mas a qualquer momento, as marcas se sobressaem em alerta, pra lembrar que tudo pode acontecer, inclusive a derrota, o coração estilhaçado, a decepção, a morte, a falta de fé, a desesperança.

Fica uma luta interna pra não se deixar dominar pela dor mas também pra não esquecê-la e lembrar que DÓI, mesmo que a gente levante depois da queda.